segunda-feira, 20 de maio de 2013

Relicário



Sempre achei interessante a ideia de colecionar coisas. Agrupá-las pela individualidade do conceito, da simetria. Onde tudo parece ter uma lógica organizacional, apesar da diversidade de formas, tamanhos e cores. Colecionava um pouco de tudo. Livros, rochas, bottons, canetas, cartas, moedas, xícaras, isqueiros, sapatos, pelúcia, flores, fotografias. Coletâneas extraordinárias e cheias de vida, mas invariavelmente previsíveis.
Não me entenda mal, eu admiro essa iniciativa. Há beleza na simplicidade. Mas tendemos a desviar a atenção quando o comum incide em nossos olhos. Cansei das coleções inférteis. Queria relíquias únicas. Então porque não colecionar sorrisos, sonhos, ideias, lembranças? Não se vê itens como esses reunidos por aí. Tentei, mas não colhi bons frutos.
Comecei pelos sorrisos genuinamente sinceros. Daqueles contagiantes, sabe? Mas eles eram tão raros que acabei doando os poucos que consegui. Seria pretensão continuar colecionando-os. Quanto aos sonhos lúcidos, às ideias mudas e a nostalgia das lembranças; identificar e catalogar todos eles era um trabalho mais árduo que prazeroso.
Singular demais pra ser coletivo.
Finalmente, pedi licença poética pra colecionar pontos. Finais, parágrafos, geométricos, cardeais. Todos reunidos desafiando a ambiguidade. Mas então as reticências surgiram. E todo aquele conceito ilimitado não soou conveniente.
Quando já não havia esperança, decidi colecionar amores. Porque não? Incontáveis padrões e formas de cultivo. Amor próprio, proibido, platônico. Desses que pulsam e te fazem querer mais.
Parecia perfeito, inusitado, original.
 Desisti. Impossível colecionar amores. Voláteis demais.